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quarta-feira, 25 de novembro de 2009

DEPRESSÃO (Facundo Cabral)


>> Não estás deprimido, estás distraído.
Distraído em relação à vida que te preenche,
Distraído em relação à vida que te rodeia,
Golfinhos, bosques, mares, montanhas, rios.
Não caias como caiu teu irmão que sofre por um único ser humano, quando existem cinco mil e seiscentos milhões no mundo.
Além de tudo, não é assim tão ruim viver só.
Eu fico bem, decidindo a cada instante o que desejo fazer, e graças à solidão conheço-me, o que é fundamental para viver.
Não faças o que fez teu pai, que se sente velho porque tem setenta anos, e esquece que Moisés comandou o Êxodo aos oitenta e Rubinstein interpretava Chopin com uma maestria sem igual aos noventa, para citar apenas dois casos conhecidos.

>> Não estás deprimido, estás distraído.
Por isso acreditas que perdeste algo, o que é impossível, porque tudo te foi dado.
Não fizeste um só cabelo de tua cabeça, portanto não és dono de coisa alguma.
Além disso, a vida não te tira coisas: te liberta de coisas. Alivia-te para que possas voar mais alto, para que alcances a plenitude.
Do útero ao túmulo, vivemos numa escola;
Por isso, o que chamas de problemas são apenas lições.
Não perdeste coisa alguma: aquele que morre apenas está adiantado em relação a nós, porque todos vamos na mesma direção. E não esqueças, que o melhor dele, o amor, continua vivo em teu coração.
Não existe a morte... Apenas a mudança. E do outro lado te esperam pessoas maravilhosas: Gandhi, o Arcanjo Miguel, Whitman, São Agostinho, Madre Teresa, teu avô e minha mãe, que acreditava que a pobreza está mais próxima do amor, porque o dinheiro nos distrai com coisas demais, e nos machuca, porque nos torna desconfiados.
Faz apenas o que amas e serás feliz. Aquele que faz o que ama, está benditamente condenado ao sucesso, que chegará quando for a hora, porque o que deve ser será, e chegará de forma natural. Não faças coisa alguma por obrigação ou por compromisso, apenas por amor. Então terás plenitude, e nessa plenitude tudo é possível sem esforço, porque és movido pela força natural da vida, a mesma que me ergueu quando caiu o avião que levava minha mulher e minha filha; a mesma que me manteve vivo quando os médicos me deram três ou quatro meses de vida.
Deus te tornou responsável por um ser humano, que és tu.
Deves trazer felicidade e liberdade para ti mesmo. E só então poderás compartilhar a vida verdadeira com todos os outros.
Lembra-te : "Amarás ao próximo como a ti mesmo". Reconcilia-te contigo, coloca-te frente ao espelho e pensa que esta criatura que vês, é uma obra de Deus, e decide neste exato momento ser feliz, porque a felicidade é uma aquisição.
Aliás, a felicidade não é um direito, mas um dever; porque se não fores feliz, estarás levando amargura para todos os teus vizinhos.
Um único homem que não possuiu talento ou valor para viver, mandou matar seis milhões de judeus, seus irmãos.
Existem tantas coisas para experimentar, e a nossa passagem pela terra é tão curta, que sofrer é uma perda de tempo. Podemos experimentar a neve no inverno e as flores na primavera, o chocolate de Perusa, a baguette francesa, os tacos mexicanos, o vinho chileno, os mares e os rios, o futebol dos brasileiros, As Mil e Uma Noites, a Divina Comédia, Quixote, Pedro Páramo, os boleros de Manzanero e as poesias de Whitman; a música de Mahler, Mozart, Chopin, Beethoven; as pinturas de Caravaggio, Rembrandt, Velázquez, Picasso e Tamayo, entre tantas maravilhas.
E se estás com câncer ou AIDS, podem acontecer duas coisas, e ambas são positivas: se a doença ganha, te liberta do corpo que é cheio de processos (tenho fome, tenho frio, tenho sono, tenho vontades, tenho razão, tenho dúvidas)... Se tu vences, serás mais humilde, mais agradecido... portanto, facilmente feliz, livre do enorme peso da culpa, da responsabilidade e da vaidade, disposto a viver cada instante profundamente, como deve ser.

>> Não estás deprimido, estás desocupado.
Ajuda a criança que precisa de ti, essa criança que será sócia do teu filho.
Ajuda os velhos e os jovens te ajudarão quando for tua vez.
Aliás, o serviço prestado é uma forma segura de ser feliz, como é gostar da natureza e cuidar dela para aqueles que virão.
Dá sem medida, e receberás sem medida.
Ama até que te tornes o ser amado; Mais ainda converte-te no próprio Amor. E não te deixes enganar por alguns homicidas e suicidas.
O bem é maioria, mas não se percebe porque é silencioso. Uma bomba faz mais barulho que uma carícia, porém, para cada bomba que destrói há milhões de carícias que alimentam a vida. Vale a pena, não é mesmo?
Se Deus possuísse uma geladeira, teria a tua foto pregada nela. Se ele possuísse uma carteira, tua foto estaria nela. Ele te envia flores a cada primavera. Ele te envia um amanhecer a cada manhã. Cada vez que desejas falar, Ele te escuta. Ele poderia viver em qualquer ponto do Universo, mas escolheu o teu coração. Encara, amigo,

>> Ele está louco por ti!

terça-feira, 20 de outubro de 2009

"A Evasão"

Mineiro escravo,
Escavo
Secreta Galeria.

Emparedado,
rastejo, suado,
à luz avara, mortiça
que alumia o olhar cansado.

Um estrondo, uma pancada!
Treme, vibra, range ao ruir
o meu túnel escorado,
e vejo então deslumbrado,
que estou de novo a sair
donde nunca tinha entrado.


Autor desconhecido - Biblioteca Municipal de Aljustrel
A foto é da "twilight zone" gerada pelas escombreiras da mina.

Retrato de uma Mãe

Uma simples mulher que, pela imensidão de seu amor,
tem um pouco de Deus.
Pela constância de sua dedicação, tem muito de anjo.

Que sendo moça, pensa como uma anciã.
Que sendo velha, age com todas as forças da juventude.

Quando ignorante, melhor que qualquer sábio,
desvenda os segredos da vida.
Quando sábia, assume a simplicidade das crianças.

Quando pobre, sabe enriquecer-se com a felicidade
dos que ama.
Quando rica, empobrece para que seu coração não sangre
ferido pelos ingratos.

Quando forte, estremece ao choro de uma criancinha.
Quando fraca, entretanto, se alteia com a bravura dos leões.

Quando viva, não lhe sabemos dar valor,
porque à sua sombra todas as dores se apagam.
Quando morta, tudo o que somos e tudo o que temos
daríamos para vê-la de novo,
e dela receber um aperto de seus braços,
uma palavra de seus lábios.

Não exijam de mim que diga o nome dessa mulher,
se não quiserem que ensope de lágrimas essa página…
porque eu a vi passar em meu caminho.

Quando crescerem vossos filhos, leiam para eles esta página.
Eles vos cobrirão de beijos a fronte,
e vos dirão que um pobre viajante aqui deixou, para todos,
o seu Retrato de Mãe.

O poema acima (Retrato de Una Madre…Hay una mujer), o qual traduz fielmente a alma de uma mãe, é de autoria de Don Ramon Angel Jara, bispo chileno famoso por sua oratória.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Receita de mulher - Vinicius de Moraes

>> As muito feias que me perdoem
Mas beleza é fundamental. É preciso
Que haja qualquer coisa de dança, qualquer coisa de haute couture
Em tudo isso ou então
Que a mulher se socialize elegantemente em azul, como na República [Popular Chinesa].
Não há meio-termo possível. É preciso Que tudo isso seja belo. É preciso que súbito
Tenha-se a impressão de ver uma garça apenas pousada e que um rosto
Adquira de vez em quando essa cor só encontrável no terceiro minuto da aurora.
É preciso que tudo isso seja sem ser, mas que se reflita e desabroche
No olhar dos homens. É preciso, é absolutamente preciso
Que tudo seja belo e inesperado. É preciso que umas pálpebras cerradas
Lembrem um verso de Eluard e que se acaricie nuns braços
Alguma coisa além da carne: que se os toque
Como ao âmbar de uma tarde. Ah, deixai-e dizer-vos
Que é preciso que a mulher que ali está como a corola ante o pássaro
Seja bela ou tenha pelo menos um rosto que lembre um templo e
Seja leve como um resto de nuvem: mas que seja uma nuvem
Com olhos e nádegas. Nádegas é importantíssimo. Olhos, então
Nem se fala, que olhem com certa maldade inocente. Uma boca
Fresca (nunca úmida!) e também de extrema pertinência.
É preciso que as extremidades sejam magras; que uns ossos
Despontem, sobretudo a rótula no cruzar das pernas, e as pontas pélvicas
No enlaçar de uma cintura semovente. Gravíssimo é, porém, o problema das saboneteiras: uma mulher sem saboneteiras É como um rio sem pontes. Indispensável
Que haja uma hipótese de barriguinha, e em seguida
A mulher se alteie em cálice, e que seus seios
Sejam uma expressão greco-romana, mais que gótica ou barroca
E possam iluminar o escuro com uma capacidade mínima de 5 velas. Sobremodo pertinaz é estarem a caveira e a coluna vertebral
Levemente à mostra; e que exista um grande latifúndio dorsal! Os membros que terminem como hastes, mas bem haja um certo volume de coxas
E que elas sejam lisas, lisas como a pétala e cobertas de suavíssima penugem
No entanto, sensível à carícia em sentido contrário.
É aconselhável na axila uma doce relva com aroma próprio
Apenas sensível (um mínimo de produtos farmacêuticos!)
Preferíveis sem dúvida os pescoços longos
De forma que a cabeça dê por vezes a impressão
De nada ter a ver com o corpo, e a mulher não lembre
Flores sem mistério. Pés e mãos devem conter elementos góticos
Discretos. A pele deve ser fresca nas mãos, nos braços, no dorso e na face
Mas que as concavidades e reentrâncias tenham uma temperatura nunca inferior A 37° centígrados podendo eventualmente provocar queimaduras
Do 1° grau. Os olhos, que sejam de preferência grandes
E de rotação pelo menos tão lenta quanto a da Terra; e
Que se coloquem sempre para lá de um invisível muro da paixão
Que é preciso ultrapassar. Que a mulher seja em princípio alta
Ou, caso baixa, que tenha a atitude mental dos altos píncaros. Ah, que a mulher dê sempre a impressão de que, se se fechar os olhos
Ao abri-los ela não mais estará presente
Com seu sorriso e suas tramas. Que ela surja, não venha; parta, não vá
E que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos fazer beber
O fel da dúvida. Oh, sobretudo
Que ele não perca nunca, não importa em que mundo
Não importa em que circunstâncias, a sua infinita volubilidade
De pássaro; e que acariciada no fundo de si mesma
Transforme-se em fera sem perder sua graça de ave; e que exale sempre
O impossível perfume; e destile sempre
O embriagante mel; e cante sempre o inaudível canto
Da sua combustão; e não deixe de ser nunca a eterna dançarina
Do efêmero; e em sua incalculável imperfeição
Constitua a coisa mais bela e mais perfeita de toda a criação inumerável. >>

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

O DESCONCERTO DO MUNDO

Os bons vi sempre passar
No mundo graves tormentos,
E, para mais me espantar,
Os maus vi sempre nadar
Em mar de contentamentos.
Cuidando alcançar assim
O bem tão mal ordenado,
Fui mau,mas fui castigado.
Assim que,só para mim,
Anda o mundo concertado.

Luis de Camões

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Porto Livre

É a tradução do nome do mediático e mastodôntico empreendimento de Alcochete. Tem tudo a ver – é fartar vilanagem! Como é que o sinistro “Pinóquio” ainda não se demitiu? E, mais preocupante, como é que ainda não ouvi nenhum alegado opinion maker dizer o que eu estou a dizer, nem se grafitaram as palavras “Sócrates para a Rua” seguidas de foices e martelos e estrelinhas como se via no pós 25 de Abril???… Que povinho tão maneirinho! A tibieza é o traço português que eu mais abomino (quais brandos costumes, quais quê! Venha o primeiro Afonso com a sua espada de 15 Kg!). Conclui-se que, sob a máscara do politicamente correcto, jogam todos pela mesma cartilha, muitos telhados de vidro, muita conveniência, muitos temas cruzados... e que temas!
Enfim, já há cerca de 7 anos que se ouviam coisas escabrosas sobre este e outros assuntos nos corredores da ParqueExpo, na altura tutelada pelo Ministério do Ambiente!!! A fuga do Guterres era mais do que esperada. Que bela lição de democracia. Uma ignomínia de todo o tamanho.


http://sol.sapo.pt/PaginaInicial/Politica/Interior.aspx?content_id=130391



D. AFONSO HENRIQUES
Pae, foste cavalleiro.
Hoje a vigilia é nossa.
Dá-nos o exemplo inteiro
E a tua inteira força!
Dá, contra a hora em que, errada,
Novos infieis vençam,
A benção como espada,
A espada como benção!



"Mensagem", Fernando Pessoa

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Tertúlia dos (Con)Vencidos I

Abdicação

Toma-me, ó noite eterna, nos teus braços E chama-me teu filho.
Eu sou um rei Que voluntariamente abandonei O meu trono de sonhos e cansaços.
Minha espada, pesada a braços lassos, Em mãos viris e calmas entreguei;
E meu ceptro e coroa - eu os deixei Na antecâmara, feitos em pedaços.
Minha cota de malha, tão inútil, Minhas esporas, de um tinir tão fútil, Deixei-as pela fria escadaria.
Despi a realeza, corpo e alma, E regressei à noite antiga e calma Como a paisagem ao morrer do dia.

Fernando Pessoa

Nenhum outro escrito ilustra tão bem o meu sentimento de desistência sem nunca verdadeiramente desistir. Adoro este poema tão visual!